2.4.07

CVM, Ipiranga e Varig

Venda da Ipiranga e da Varig põe à prova ação da CVM
INVESTIGAÇÃO Nos dois casos, investidores lucraram com informações que vazaram antes do fechamento da transação
Irany Terez RIO
O Estado de São Paulo - 01/04/2007

Os casos recentes de compra da Ipiranga e da Nova Varig comprovaram que, no Brasil, o sigilo negocial encontra inúmeros caminhos para inconfidências. Em ambos os casos, a informação sobre a transação vazou, pelo menos, uma semana antes do fechamento do acordo. No primeiro caso, para privilegiados que lucraram milhões de reais na compra de ações do grupo Ipiranga na Bolsa de São Paulo. Quatro deles tiveram o dinheiro bloqueado, mas há indícios de que, no mínimo, outros 22 tenham usado a mesma artimanha. No segundo caso, a negociação da Gol com a Varig foi amplamente noticiada antes da batida do martelo.
Em 2006, segundo dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), as operações de fusões e aquisições, reestruturações societárias e ofertas públicas totalizaram R$ 131,7 bilhões, o maior volume desde 2002. Não há, na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), um balanço específico sobre os processos de "inside information", como é conhecido no mercado o uso de informação privilegiada. Mas o presidente da autarquia, Marcelo Trindade, estima que no Brasil os casos devem superar o volume contado na Inglaterra, onde pesquisa comprovou "inside" em um quarto dos negócios fechados.
Trindade está disposto a fazer do caso Ipiranga um emblema para a moralização do mercado. "Condutas como essa passaram a ser tipificadas como crime a partir de 2002. E a atuação que está sendo feita neste caso vai virar um padrão, para que a punição exemplar sirva para desestimular esta prática", afirma ele.
A punição vai de multa e desabilitação para atuação no mercado até prisão por cinco anos. Mas, mesmo que fique comprovado o crime no vazamento de informação no caso Ipiranga, ninguém chegará a ir para a cadeia. O procurador Sady Torres Filho, que coordena o grupo de Mercado de Capitais do Ministério Público Federal, que investiga o caso junto com a CVM, explica que o réu primário terá uma eventual condenação à prisão substituída por pena restritiva de direito. Renato Chaves, diretor de Participações da Previ, fundo de previdência dos funcionários do Banco do Brasil, atesta que o vazamento de informação é um problema crônico no mercado. "Falta um caso com punição exemplar para passar um recado de que irregularidades como estas não passarão em branco. Eu só lembro de uma punição por informação privilegiada, no caso da Copel", diz. A Previ é o maior investidor individual do País e responde por quase 5% de todo o dinheiro movimentado na Bovespa. O caso ao qual se refere Chaves é o do vazamento de informações durante o processo de privatização da Companhia Paranaense de Eletricidade (Copel), em 2001. Apesar de a venda não ter sido efetivada, a administradora de recursos Fator lucrou, durante o processo de negociação, com a compra e venda de ações, feitas a partir de informações de bastidores. Foi a primeira punição para este tipo de irregularidade na história financeira do País e a gestora foi condenada, em 2004, a pagar multa de R$ 600 mil. Seu principal executivo, Walter Appel, além da multa máxima prevista para pessoa física, R$ 500 mil, teve cassada a autorização para atuar no mercado.
No caso da Ipiranga, ainda não foram revelados os nomes dos suspeitos do uso de informação privilegiada. Sabe-se que um fundo de investimentos sediado no Estado americano de Delaware e um gerente executivo da Petrobrás estão sendo investigados. O gerente, que ocupava um cargo de confiança na BR Distribuidora, subsidiária da estatal, foi afastado para responder a uma auditoria interna na empresa. Nos corredores da estatal, há rumores de que outros funcionários também tenham aplicado em ações da Ipiranga na semana que antecedeu o fechamento do negócio. Trindade acredita que, mesmo que não seja efetivada nenhuma prisão, o caso já criou um novo padrão de fiscalização. "A condenação administrativa dói muito. E a rapidez com que estão sendo tomadas as medidas vai inibir novos casos." Ele diz que a multa pode chegar a três vezes o ganho obtido com a operação ou a R$ 500 mil.