18.7.07

Cade e aquisição e fusão

Segundo reportagem do Estado (Concentração industrial aumenta no País CONCORRÊNCIA Movimento foi mais forte nas áreas de petroquímica e química, revela trabalho de ex-conselheira do Cade, de Nilson Brandão Junior, p. b5, 16/07/2007) foram realizadas 180 fusões e aquisições no

período de 1995 a 2007 nos setores químico e petroquímico. A concentração industrial aumentou em 43% no setor mecânico nos últimos 10 anos e
59% do setor petroquímico é da Petrobrás. E onde está o Cade, o órgão que deveria tratar deste assunto?

Segundo dados do anexo da reportagem, somente 2% dos processos analisados são modificados, versus uma taxa de 5% dos países da OCDE.

Concentração industrial aumenta no País
Movimento foi mais forte nas áreas de petroquímica e química, revela trabalho de ex-conselheira do Cade
Nilson Brandão Junior - O Estado de São Paulo - 16/07/2007, p. b5


A concentração de empresas em quatro setores industriais - petroquímica, mecânica, eletroeletrônica e siderurgia - aumentou fortemente desde meados da década passada. O movimento foi mais intenso na área de química e petroquímica. A Petrobrás, que dominava 46% do setor em 1994, chegou a 2005 com 59%, fatia que vai a 63% levando-se em conta empresas controladas. E pode avançar mais com a operação em análise no governo de compra da Ipiranga pela estatal, junto com os grupos Braskem e Ultra.


Os dados fazem parte de um livro que está sendo preparado pela pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Lucia Helena Salgado, ex-conselheira do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), sobre a defesa da concorrência no País entre 1994 e 2005. O trabalho revela que as decisões do Cade nesse período não evitaram a concentração de mercado em 29 de 30 setores pesquisados. A exceção é o setor automobilístico, que registrou uma desconcentração com a chegada das novas fábricas, estimuladas por uma política de atração de investimentos para o Brasil. Quatro setores foram analisados detalhadamente, com base num indicador que mede a concentração.


Segundo a pesquisadora, o aumento da concentração não é necessariamente ruim, pois depende do grau de dependência que os consumidores têm dos produtos que a empresa vende. "Não dá pra dizer se é bom ou ruim. Não se pode ter visão simplista", diz ela. No caso do setor petroquímico, o estudo mostra que houve "um aumento significativo" desse indicador, chamado IHH (Índice de Herfindahl-Hirschman). A avaliação é que esse avanço decorreu da redução do número de empresas e do crescimento da participação da Petrobrás no setor.


Lucia Helena avalia que a concentração no caso da petroquímica é mais complicada, porque a Petrobrás domina vários mercados do setor e poderia, por hipótese, criar barreiras à entrada de outras empresas. "Ela pode inviabilizar que seus clientes tenham outras alternativas de aquisição de produtos que não dela mesma", comenta. Por isso, pondera que a operação de compra da Ipiranga deve ser avaliada com cuidado.


ONDA DE FUSÕES


Um levantamento da KPMG mostra que entre 1995 e o primeiro semestre de 2007 ocorreram 180 operações de fusões e aquisições ligadas ao setor químico e petroquímico brasileiro. A última operação relevante foi em janeiro deste ano, quando um consórcio formado por Petrobrás, Braskem e Ultra comprou as operações do Grupo Ipiranga por US$ 4 bilhões.


A estatal, que conduziu a estruturação dos pólos químicos nos anos 70, havia praticamente se afastado do setor durante a década de 1990. Mais recentemente, decidiu voltar ao setor, com investimentos próprios e a compra da Ipiranga. "O fato de uma empresa operar em vários mercados, ser um conglomerado em diversas áreas, permite usar estrategicamente o domínio em um mercado sobre outros, criando dificuldades aqui para ganhar alguma vantagem ali", diz a pesquisadora.


NOVAS FRONTEIRAS

No setor mecânico, a concentração avançou 43% no mesmo período de 10 anos. O destaque foi o forte avanço da Weg, que detinha 6,1% de participação no segmento e agora tem 23,3%. O presidente da Weg, Décio Silva, explica que no período a empresa abriu bases no exterior, o que aumentou as exportações a partir do Brasil, com taxas de crescimento perto de 20% a 30% ao ano, além do trabalho com produtos de maior valor agregado.


A especialista do Ipea também explica que as indústrias brasileiras ficaram mais expostas à concorrência internacional desde o início da década passada, o que levou uma parte delas a buscar associações. Além disso, grupos estrangeiros fizeram compras de empresas brasileiras. No setor metalúrgico e siderúrgico, os quatro maiores grupos no País - Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Gerdau, Usiminas e Arcelor - controlam negócios que representam quase dois terços de toda a produção local.


Defesa da Concorrência é pouco Eficaz, diz pesquisadora do Ipea


A defesa da concorrência no País tem baixa eficácia. A avaliação é da economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Lucia Hela Salgado. Segundo ela, há indícios que apontam nessa direção. Um deles é o fato de que a proporção de intervenções - decisões que modificam os negócios de fusão ou aquisição julgados - tem sido em média de 2% dos processos no País, bem abaixo da taxa de 5% dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).


Além de a taxa ser relativamente baixa, o sistema de defesa não conta ainda com a alternativa de análise prévia e há falhas no desenho institucional, como a sobreposição de órgãos na análise de casos. Exemplo disso é a necessidade de os processos que chegam ao Conselho de Defesa Econômica (Cade) precisarem passar também pelas secretarias de Direitos Econômico (SDE) e de Acompanhamento Econômico (Seae).


"Apesar disso, em termos de qualidade de análise econômicas, as decisões do Cade não deixam nada a dever aos países de primeiro mundo", diz ela. Outro aspecto importante é o que chama de falta de uma "cultura de defesa da concorrência" no Judiciário. Não raro, explica a economista, decisões no âmbito do Cade são derrubadas na Justiça. "As decisões são revistas e acabam não sendo mantidas", explica ela.

Exemplo disso é o caso da compra da Chocolates Garoto pela subsidiária local da suíça Nestlé. O Cada desaprovou a venda da Garoto. A Nestlé recorreu a Justiça contra a decisão do Cade e o Juiz Itagiba Cata Preta Neto, da 4a. Vara Federal do Distrito Federal, acatou o pedido da multinacional e anulou a decisão do conselho. A Garoto foi comprada em 2002 por cerca de R$600 milhões. A decisão do Cade saiu apena em 2005 e a sentença da Justiça em março deste ano.

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