No dia 7 de outubro fez 4 anos que o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) foi criado por uma resolução do Conselho Federal de Contabilidade. É inegável que o CPC tem realizado um trabalho de fôlego, em especial nos últimos dois anos, adaptando as normas internacionais do Iasb.
A Lei 11638, que adotou as normas internacionais de contabilidade no Brasil, não designou explicitamente o CPC como normatizador contábil. Entretanto, as características exigidas pela lei para um organismo contábil só são satisfeitas por esta entidade. Ou seja, a lei nomeou implicitamente o CPC como responsável pelo processo de convergência contábil.
Mas será que estamos prontos para fazer a convergência? Em lugar de fazer uma longa discussão sobre o assunto, irei deter no processo de implantação das normas. Para isto, escolhi como foco a primeira norma emitida pelo CPC, denominada de CPC-01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos. (O nome da norma é este mesmo, inclusive usando uma numeração com o zero a esquerda, que não possui nenhum significado no nosso sistema numérico)
A CPC 01 diz respeito a melhoria do processo de avaliação dos ativos de uma entidade. Regularmente a entidade irá calcular dois valores para cada ativo ou grupo de ativos: o valor em uso e o valor de troca. O valor em uso corresponde a estimativa de riqueza que será gerada pelo ativo no futuro através do seu uso na entidade; o valor de troca corresponde a quanto se obteria no mercado com o ativo. São conceitos antigos, que remotam aos gregos.
Um ativo pode ter elevado valor em uso, mas baixo valor de troca. É o caso de um computador antigo, mas que ainda é utilizado na empresa. O inverso também pode ocorrer: baixo valor em uso e elevado valor de troca. Um exemplo seria um terreno que a empresa está esperando valorizar.
Depois de calculado estes dois valores, escolhe o maior deles. A segunda etapa é comparar com o valor que está registrado na contabilidade. Se o valor encontrado nos cálculos for menor isto significa que o valor contábil é um número elevado. Como resultado, substitui o valor contábil pelo valor encontrado.
A idéia é simples, mas certamente sua execução é penosa por duas razões. Provavelmente existirá um número elevado de ativos para se calcular o valor em uso e o valor de troca. A segunda razão é que se trata de um processo de estimativa. A estimativa do valor de troca pode ser obtido no mercado. Para alguns ativos isto será fácil para a entidade conseguir, como é o caso dos automóveis e terrenos. Existem outros ativos que não possuem um mercado e o valor em uso torna-se mais relevante na aplicação da norma.
Para calcular o valor em uso é necessário estimar o fluxo de caixa proveniente do ativo e uma taxa de desconto correspondente. A questão básica da aplicação do CPC 01 é a qualidade das informações resultantes dos cálculos. Aparentemente esta afirmação é muito pessimista, mas existe uma razão para este temor.
Considere os Laudos de Avaliação das empresas que desejam fazer uma Oferta Pública de Aquisição. Estes laudos podem ser encontrados no endereço da CVM. Eles são feitos por uma empresa de consultoria, que recebe valores elevados pelo texto. O objetivo do laudo é apresentar uma estimativa do preço de uma ação. Geralmente se utiliza projetar o fluxo de caixa e trazer a valor presente, usando uma taxa de desconto. Exatamente como se obtém o valor em uso do CPC 01.
Quando se analisa os laudos de avaliação das empresas brasileiras nos últimos anos percebe-se uma grande quantidade de erros. Não estamos considerando projeções erradas, mas erros conceituais. Alguns destes erros são extremamente óbvios para um estudante, outros são mais sutis. É comum encontrar laudos onde se utiliza o custo médio ponderado de capital (CMPC ou WACC, em razão da sigla em inglês) com os valores contábeis, em lugar dos valores de mercado. Ou desconta o fluxo de caixa dos acionistas usando o CMPC. Ou então trabalha-se com a Selic como taxa livre de risco e adiciona o risco Brasil na taxa de desconto.
Se um laudo feito por uma empresa contratada a valores expressivos e por pessoas pretensamente especialistas no assunto possuem estes erros, pode-se certamente temer pela qualidade das informações que serão originárias do CPC 01.
Como professor de contabilidade considero que a norma traz uma grande vantagem: teremos agora claramente um grande motivo para ensinar finanças corporativas para nossos alunos.